* Por que os ingleses se sentem cada vez mais católicos.

07-02-2011 10:43

No dia 31 de dezembro de 2010, Edwin Barnes,  bispo da Igreja Anglicana, entrou em plena comunhão com a Igreja Católica, junto com outros quatros bispos ingleses.

Entrevistado com exclusividade pelo sítio Ilsussidiario.net, Barnes revela as razões profundas da sua escolha, o problema das mulheres-bispo e o encontro com o Papa Bento XVI, em quem encontrou “a alegria de ser acolhido por um autêntico Pai em Deus”. Revelando ainda: “Espero que logo a Igreja Católica se torne a Igreja da nação inglesa”.

A reportagem é de Pietro Vernizzi, publicada no sítio Il Sussidiario. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis e entrevista.

Tendo sempre feito parte do grupo anglo-católico, pode nos dizer qual é a sua posição dentro da Igreja Anglicana?

O anglo-catolicismo se desenvolveu a partir do Movimento de Oxford, no século XIX, fundado por Pusey, professor de Oxford, Keble, um pároco do interior, e Newman, vigário da capela da Universidade de Oxford. Ele cresceu e floresceu até o fim do século XX, desde que os paramentos litúrgicos eucarísticos e as regulares e frequentes celebrações da Eucaristia se tornaram a norma em mais da metade das igrejas paroquiais. O nosso culto na maior parte dos lugares tem o aspecto exterior do catolicismo, ao invés do protestantismo.

O que é a Church Union e quais foram os seus frutos na Inglaterra?

A Church Union foi fundada há mais de um século para promover as relações entre a Igreja Anglicana e a Católica. Ela trabalhou para proteger e apoiar os sacerdotes que eram perseguidos pelo fato de introduzirem as práticas de culto católicas. Os seus membros desempenharam um papel importante nos Colóquios de Malines [ao longo dos quais se discutiu a possibilidade de uma reunificação entre católicos e anglicanos]. E quem liderava o grupo anglicano era Lord Halifax, fundador da Church Union. Em seguida, os membros da Church Union se tornaram influentes ao longo dos colóquios daArcic, as discussões internacionais entre a Igreja Católica e a Associação das Igrejas Anglicanas.

Quais foram os fatores decisivos que o convenceram a entrar na Igreja Católica?

Em 1992, a Igreja Anglicana, por meio do Sínodo Geral, decidiu dar continuidade à ordenação das mulheres-padre. Muitos de nós sentiram que essa era uma decisão que ia além da competência de uma pequena parte da Igreja universal. De fato, a Igreja Anglicana sempre disse ser parte da Igreja “Una, Santa, Católica e Apostólica”. Porém, ainda era possível continuar fazendo parte da Igreja Anglicana, a partir do momento que a nossa Igreja havia decidido que a questão não estava definida de uma vez por todas. Dizia-se que nós nos encontrávamos em um período de “transição”. Finalmente, pudemos decidir que nos havíamos equivocado, e, enquanto isso, foram designados alguns bispos (um dos quais era eu) para administrar as paróquias e os indivíduos que não podiam aceitar as mulheres-padre.Ora, tendo decidido consagrar algumas mulheres-bispo, não há mais espaço para nenhuma dúvida, e no máximo poderíamos consentir com uma tolerância “a contragosto”.

Que papel tiveram as tomadas de posição de Bento XVI na sua conversão?

A  Anglicanorum Coetibus [o documento de Ratzinger dirigido aos anglicanos que se convertem ao catolicismo] me pareceu uma oferta muito generosa por parte do Santo Padre, em resposta aos pedidos dos anglicanos, e que eu devia levar muito seriamente. Vi o Papa Bento pela primeira vez em Fátima, no começo de 2010. E a sua visita à Inglaterra reforçou a minha convicção de me encontrar diante de um autêntico Pai em Deus. Acredito que foram as orações do cardeal Newman, mais do que a sua atual beatificação, que levaram muitos de nós para a Igreja Católica.

Como o senhor vive a sua relação com a autoridade do Papa e com a sua infalibilidade?

Fiquei cada vez mais preocupado com o modo pelo qual a Igreja Anglicana reivindicava autoridade para si mesma. Chegando a desenvolver uma teoria sobre a autonomia provincial que permitiu que uma parte dos fiéis anglicanos dissentisse de modo dramático em pontos cruciais da fé, sem nenhuma crítica do arcebispo de Canterbury, que é, no mínimo, um Primus inter Pares na nossa comunhão. Aquilo que eu vejo no Santo Padre não é tanto a infalibilidade, mas sim uma sensação de liderança paterna. Poderia ser necessário aceitar uma autoridade infalível, mas não acho isso muito confortável. Mas é um fato amável e alegre ser acolhido – e também criticado, quando necessário – por um autêntico Pai em Deus.

Até que ponto a Igreja Anglicana é uma realidade ainda viva e incisiva e, ao contrário, até que ponto está em crise?

A Igreja Anglicana conserva um afeto remanescente no coração de muitos homens e mulheres ingleses. A celebração do Armistício [o fim da Primeira Guerra Mundial] foi um momento em que as pessoas esperavam que a Igreja nacional iria assumir um papel de liderança. Mas agora tornou-se tão confusa naquilo que afirma sobre a moral ou sobre outras questões que não é mais capaz de fornecer conselhos claros a ninguém.

Mas porque o senhor considera tão inaceitável a ordenação das mulheres-padre?

Inúmeros anglicanos prontamente aceitaram as mulheres-padre e provavelmente farão o mesmo quando forem consagradas como bispas. Muitos, no entanto, acreditam que isso é contrário às Sagradas Escrituras – por exemplo, as cartas a Timóteo – e que a escolha de Jesus de escolher apenas homens como os seus apóstolos é definitiva. Até porque Jesus estava pronto para romper qualquer tabu social do seu tempo. Portanto, se ele não introduziu as mulheres-padre, não é porque ele era um judeu palestino que viveu no século I.

E sobre a introdução das mulheres-bispo, o que o senhor pensa a respeito?

Nas questões relativas aos sacramentos, é sempre melhor tomar o caminho mais seguro. No momento em que fossem ordenadas mulheres-bispo, como poderemos estar certos da validade da ordenação dos sacerdotes por parte delas? A própria Igreja Anglicana disse que a ordenação das mulheres ainda é um problema em aberto. Porém, ela continua se comportando como se tivesse resolvido a questão em completa autonomia.

Nos Coros de A Rocha, Eliot descreveu a crise dramática da Igreja. Até que ponto a sua leitura ainda é atual?

Há um número de padres em queda contínua, apesar do afluxo das mulheres ordenadas. As paróquias estão para ser fechadas ou fundidas. E os novos seminaristas são sempre mais frequentemente idosos aposentados ou maiores de 50 anos. Muitos são padres de meio turno e parecem não levar minimamente em consideração os sacrifícios que o ministério deveria comportar. Pelo contrário, entre os que buscam fazer parte do Ordinariato [a estrutura reservada para os que querem se tornar católicos], há muitos jovens sacerdotes que estão prontos para abandonar as suas casas e os seus salários. Temo que, dentro de um tempo muito breve, a Igreja Anglicana e a Igreja inglesa deixarão de ser sinônimos, e ela não conseguirá mais fornecer o ministério pastoral em todo o país.

Até que ponto os católicos ingleses ainda são considerados cidadãos de segunda classe?

O grande sucesso do movimento anglo-católico foi o fato de tornar o catolicismo possível para os ingleses. Tempos atrás, a Igreja Católica era vista como um corpo alheio, composto em grande parte por irlandeses que vieram para cá em busca de trabalho e governado pelos italianos. Hoje, as coisas mudaram muito. E rezo para que o Ordinariato ajude muitas pessoas a ver a Igreja Católica como a Igreja da nossa nação. Isso vai levar tempo, mas acredito que vai acontecer.


fonte comunidade shalom